A minha descoberta de 2010
Coluna de hoje do Expresso online:
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Ou seja, Rentes não escreve com aquela prosa pedante e nevoenta dos Vergílios Ferreiras. Sobre o romance "A Amante Holandesa" (Quetzal), Bruno Vieira Amaral, no i, já disse tudo . Gostaria apenas de acrescentar que estamos na presença de um romance raríssimo na nossa literatura, porque, oh! heresia, tem um plot, um enredo bem montado, porque não tem medo de contar uma estória ao mesmo tempo que traça um fresco social (entre a Bragança das mães e meninas e uma aldeia onde existe aquela violência que apenas o "Correio da Manhã" apanha).
II. No diário "Tempo Contado" (Quetzal), Rentes de Carvalho confessa a admiração por um romance de João Ubaldo Ribeiro: "Sargento Getúlio" (Edições Nelson de Matos), esse fabuloso retrato do sertão brasileiro feito através de um vertiginoso monólogo. Nesse livro, Ubaldo capta o vocabulário das gentes locais, e o dito monólogo é feito com esse vocabulário popular e até com os erros ortográficos e gramaticais. Rentes não tem esta ambição quase etnográfica de Ubaldo, mas também recupera um português antigo, um português telúrico que estava esquecido. Para a geração educada na americanização da linguagem (andar à porrada é bullying; trabalhar bem é networking), o português de Rentes é quase uma nova linguagem: "monturo", "vou-me a passear pela alameda", "pertinácia", "felizmente chegamos sem empeno", "amesendamos num restaurante", "dia cinzento como o de ontem, mas morrinha em vez de nevoeiro", "no quarto de banho ponho-lhe um esparadrapo","manhã gris, ventosa e tristonha" (itálicos meus).
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