Defender a União Europeia
Texto de hoje do Expresso online
I. A esquerda está a desenvolver uma crescente retórica nacionalista; o vocabulário soberanista e crítico da UE está a ganhar força nas esquerdas, e não só nas esquerdas radicais. Ou seja, o nacionalismo de esquerda está a juntar-se ao nacionalismo de direita numa espécie de aliança contra a UE, contra a "Europa profanadora". Ora, quando eu vejo a extrema-esquerda e a extrema-direita juntinhas num ataque a um "inimigo", eu sei que devo defender esse "inimigo". E, de facto, é preciso defender a UE contra os populismos esquerdistas e direitistas. Um exemplo francês: a direita francesa não quer os ciganos em França; a esquerda francesa não quer os trabalhadores polacos em França. Contra estes nacionalismos, é preciso defender uma UE forte, uma Comissão forte.
II. Vivemos uma época confusa. Todos os dias há avanços e recuos na "construção europeia". Todos os dias há alguma coisa que nos irrita (BCE, Merkel, Juncker, etc). Mas, no meio deste caos financeiro, convém relembrar uma velha certeza política, que não pode ser esquecida: a UE é o nosso maior bem político. Convém relembrar que a vida na Europa - tal como a conhecemos hoje - não é natural, não é a ordem natural das coisas. A maravilha que é andar pela Europa sem a necessidade de mostrar papéis não é um dado natural: é uma construção política da UE. O facto de podermos vender os nossos produtos nos países mais ricos - em mercado aberto - não é um dado natural: é uma construção política da UE. O facto de haver um actor (Comissão) com a legitimidade para atacar o racismo de Sarkozy não é um dado natural: é uma construção política da UE. E, acima de tudo, é preciso lembrar outra coisa: com a UE, as disputas entre estados já não são decididas pela espada . Com a UE, os Estados que se odeiam mutuamente são forçados a dialogar de forma civilizada (e estes ódios ainda existem) .
III. De vez em quando, é preciso relembrar que aquilo que damos por garantido, aquilo que julgamos ser o desenvolvimento natural das coisas é, na verdade, uma construção política. E esta construção, como todas as construções humanas, pode ser destruída.

