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Clube das Repúblicas Mortas

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07
Jan13

A UE ou a Constituição?

Henrique Raposo

 

 

pp. 190-192


O umbigo de Soares

Caro dr. Mário Soares, este telegrama ultra-mega-neo-liberal tem um propósito simples: provar que V. Exa. não percebe nada da União Europeia. Nada. Aliás, o meu caro amigo está, desde já, chumbado na cadeira de Integração Europeia.

V. Exa. estabelece sempre uma ligação directa entre a União Europeia (UE) e o Estado Social. Na sua cabeça, a UE é sinónimo de Estado Social. Pior: é sinónimo do Estado Social que existe aqui no sul da Europa. O seu raciocínio está errado. A UE, meu caro, não mete aquele burocrático bedelho nos assuntos do Estado Social. A construção do dito Estado Social é uma tarefa que cabe, em exclusivo, aos diferentes Estados da União. É por isso que não existe um modelo social europeu, mas sim diversos modelos. O modelo nórdico, por exemplo, tem uma natureza liberal, enquanto o modelo sulista tem um carácter socialista e corporativo. A verdadeira atividade da UE incide sobre uma coisa que está a milhas ideológicas do Estado Social, a saber: o Mercado Único. O coração da UE é liberal, meu caro Mário. E sabe porquê? Porque o comércio livre é a primeira linha de defesa contra o fantasma do nacionalismo. Se não entender isto, V. Exa. nunca compreenderá a natureza da UE, e a sua "Europa" será sempre uma extensão do seu umbigo ideológico.

V. Exa. devia prestar mais atenção aos socialistas franceses, que sempre rotularam a UE de inimiga do Estado Social francês. Não por acaso, os socialistas gauleses têm um discurso soberanista e até xenófobo ("canalizador polaco"). Claro que esta xenofobia de esquerda é disfarçada pelos constantes gritos contra o "neoliberalismo". Quando xingam o "neoliberalismo", os esquerdistas franceses (e portugueses) deixam de ser nacionalistas, e passam a ser querubins amestrados no combate contra a pérfida globalização, ou coisa assim. Mas, meu caro Mário, não se iluda com estes truques semânticos: o Estado Social é, neste momento, um motor do nacionalismo. Na segunda metade do século XX, a UE foi feita contra o nacionalismo de direita. Agora, a UE será feita contra este nacionalismo de esquerda. É por isso que lhe digo o seguinte: o meu caro amigo vai ter de fazer uma escolha histórica.

V. Exa. criou esta III República com base em duas narrativas fundadoras: Portugal devia estar no coração da UE, e devia construir um modelo social francês. Ora, em 2010, podemos dizer que as duas narrativas estão em rota de colisão. Ou saímos da UE para mantermos o Estado Social com sotaque francês, ou ficamos na UE e reformamos o Estado Social (adoptando um sotaque nórdico). V. Exa. vai ter de escolher: ou está com a Europa, ou está com o nacionalismo dos direitos adquiridos.

 

Julho 2010

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