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Devido à fraca qualidade do autor do costume, a gerência de "A Tempo e a Desmodo" resolveu abrir uma nova secção: "os convidados". O convidado desta semana é Rui Alpalhão, Professor Associado Convidado, IBS.
Querer jogar com nota artística naquele relvado é o mesmo que pedir à fanfarra dos bombeiros para tocar a nona.
O Berlusconi da esquerda
(...) Berlim é o principal obstáculo à criação de um mercado europeu de energia. Com unidade energética, a UE poderia enfrentar o cerco da Rússia. A Alemanha, porém, impede a formação dessa frente unida, porque está mais interessada em manter uma relação especial com os czares. Ao dormir desta maneira com Moscovo, Berlim está a cometer adultério europeísta. E, nesta traição, uma personagem tem particular relevo: Gerhard Schroder, o Jorge Coelho da política internacional.
Ainda como chanceler, Schroder negociou com Putin a construção de um gasoduto entre a Rússia e a Alemanha ao longo do Mar Báltico (o NordStream). O acordo foi finalizado dias antes das eleições alemãs de 2005, que Schroder perdeu para Merkel. Pouco tempo depois, Schroder começou a trabalhar para a Gazprom, a empresa russa responsável pelo gasoduto. Como é óbvio, estas acções de Schroder são, no mínimo, questionáveis, mas nunca geraram grande polémica na Europa. É natural. Schroeder é de esquerda e reprovou a Guerra do Iraque, logo, é um santo acima da crítica (...) Schroeder é o Berlusconi da esquerda (...) Através desta cajadada russo-germânica à moda antiga, Schroeder conseguiu matar dois coelhos europeus: o mercado de energia comum, como já vimos, e a solidariedade entre a velha Europa e a nova Europa. É bom lembrar que a Polónia e as Repúblicas Bálticas foram as vítimas directas deste adultério germânico. Estes Estados sentem-se enganados pela Alemanha, a principal nação da UE e a suposta líder normativa do diálogo entre povos europeus. Por que razão Berlim não foi capaz de projectar o gasoduto ao longo destes países? (...)
Verão 2009
Dorian Gray em Tblissi
Um espectro ensombra a Europa: o culto amaricado da paz. Um culto que depende de uma estranha ginástica amoral que faz lembrar Dorian Gray (...) a Europa está sempre a falar de Paz em abstracto, mas depois é incapaz de lutar pela paz real e concreta. Esta Europa assistiu, na primeira fila, ao massacre de Srebrenica sem ter a coragem para intervir. Esta Europa recusa honrar os seus compromissos no Afeganistão. E, agora, esta Europa da Paz é incapaz de tomar uma atitude firme perante a estratégia colonial da Rússia. Reparem: não estou a pedir um Lord Byron para lutar e morrer pela liberdade desta Grécia perdida no Cáucaso - a Geórgia. Estou apenas a dizer que a Europa tinha o dever de dar uma resposta diplomática firme perante o imperialismo russo. E não deu (...) as tropas russas bombardearam Gori. Esta cidade não fica na Ossétia do Sul (...) é o ponto de passagem do único pipeline em direcção à Europa que escapa às garras da Rússia. Ou seja, esta guerra também foi uma chantagem energética sobre os europeus. E qual foi a reacção da Europa? Deu umas palmadinhas carinhosas no lombo do urso russo. Alguns europeus, como João Soares, até afirmaram que os russos apenas responderam a um ataque tresloucado da Geórgia. (...) a Geórgia, essa potência intercontinental, queria anexar esse pequeno enclave inofensivo que dá pelo nome de Rússia.
(...) Ao abandonar a Geórgia, com medo de perder o gás russo, a Europa está a trair pessoas que vivem segundo os princípios europeus. Estas pessoas têm nome próprio; não estamos aqui a falar da tal Humanidade, mas da Natia Naskidasvili ou da Mariam Dekanoidze. (...) Há 30 anos, a Europa tinha medo de uma invasão soviética. Hoje, a Europa receia ficar sem gás russo. Em 1978, os europeus temiam uma guerra. Em 2008, os europeus temem um duche frio. A Europa aguentou o espectro do Exército Vermelho, e venceu em 1989. Agora, essa mesma Europa não consegue suportar a ideia de passar uns dias sem esquentador (...)
Verão 2008
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