Os viscondes das PPP
Senhor primeiro-ministro, estou muito contente com o tautau que V. Exa. aplicou no rabiosque carnavalesco do visconde da Madeira. Mas, se não se importa, eu gostava de relembrar que há mais tautau para distribuir, há mais viscondes para meter na ordem. Para começar, era muito importante que V. Exa. renegociasse os contratos das PPP. As PPP, as SCUT & afins são as novas rendas e prebendas nobiliárquicas, e estão ao serviço dos viscondes do alcatrão. Convém acabar com isto, meu caro. É urgente meter o dr. Jorge Coelho a choramingar, qual Ana Avoila do alcatrão. O dr. Jorge Coelho e os outros drs. Jorges Coelho não podem continuar a passar entre os intervalos da chuva bíblica que está a inundar a carteira dos portugueses. Quantas Madeiras cabem naquilo que vamos pagar pelas PPP, meu caro? Quantos buracos da Madeira cabem nas rendas da Mota-Engil e das outras Motas-Engil?
Como V. Exa. já percebeu, o nosso problema não começa nos mercados externos, começa nas construtoras e concessionárias internas, sempre auxiliadas pelos escritórios-de-advogados-da-Avenida-da-Liberdade, esses eternos defensores do interesse nacional. Há que renegociar esta dívida interna. De forma simples e direta, o meu caro primeiro-ministro tem de dizer o seguinte às construtoras: lamentamos, mas não há dinheiro, os portugueses não vão pagar aquilo que V. Exas. acordaram com Sócrates e Lino. Esta medida é da mais elementar justiça, meu caro Pedro. Os impostos e sacrifícios que V. Exa. já pediu só serão legítimos - a médio prazo - se os contratos leoninos das PPP forem renegociados de alto a baixo. Renegociar é o seu dever como primeiro-ministro, em nome dos atuais contribuintes e, sobretudo, em nome dos contribuintes do futuro. Sim, do futuro. Pelas minhas contas de conservador forreta, uma criança que nasça hoje ainda vai ter de pagar as PPP lá por 2030 e 2040. Ser escravo fiscal das PPP da dupla Sócrates & Lino não é uma coisa que devemos legar aos nossos filhos, não acha?
Há momentos em que a legalidade perde legitimidade, meu caro Pedro. Este é um desses momentos. Os contratos das PPP são ilegítimos, até porque rasgam o contrato entre gerações. São moralmente inaceitáveis antes de serem financeiramente insustentáveis. Portanto, esta é uma guerra mais do que justa, meu caro. Como diz? Podemos perder essas renegociações em tribunal? Duvido. Sabe porquê? Porque V. Exa. levará Carl Schmitt para a sala de audiências. E, se Schmitt não for suficiente, o senhor primeiro-ministro poderá fazer outra coisa: contratar os tais escritórios de advogados que fizeram as PPP. Quem melhor para desfazer uma coisa do que o criador da coisa? Seria o chamado inside job.
24 de Setembro, Expresso