Uma grande escritora
Uma grande escritora: Thelma Schoonmaker, a "montadora" de Scorsese. Mesmo quando o boss falha, a escrita dela não engana.
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Uma grande escritora: Thelma Schoonmaker, a "montadora" de Scorsese. Mesmo quando o boss falha, a escrita dela não engana.
Este post de Adolfo Mesquita Nunes sobre a - inteligente - estratégia do PSD, e o desafio que essa estratégia representa para o CDS.
... quando ele apenas fala dos teus textos mauzinhos. Os bons não precisam de comentários e de bajulações. Ou seja, um amigo não é um bajulador.
Crónica/reportagem, Expresso 17 de Julho.
Aqui o menino vestiu a farda de cidadão (calções, t-shirt e havaianas) e decidiu ir assistir ao debate do estado da nação. Achei a ideia gira. Afinal de contas, o estado da nação é uma espécie de Prós e Contras com a imensa vantagem de ter Jaime Gama no lugar de Fátima Campos Ferreira. Foi uma aventura, meus amigos. “Ir ao parlamento” devia constar do menu do desporto radical.
Em direcção à Assembleia, desci a Rua de São Bento. Há imenso tempo que não passava por ali. E o choque foi grande. A Rua de São Bento está suja e abandonada. Aliás, esta rua, como tantas outras, é a metáfora urbanística do estado da nação. Está abandonada, porque uma iníqua lei da rendas destruiu os prédios antigos, que, agora, começam a ser consumidos por derrocadas e incêndios (para alterarem a lei das rendas, os políticos precisam de outro incêndio do Chiado?). Depois, a calçada está sujíssima. E o pior nem é a sujidade. Os constantes buracos na calçada é que são o (empoeirado) inferno. Como a rua está num permanente estado de obras, a calçada nunca está completa. Aquela rua, como tantas outras, parece um parque infantil para hooligans: há pedras espalhadas por todo o lado à espera de serem arremessadas. Ao andar por ali, é impossível não pensar nisto: o lóbi da construção civil tomou conta da cidade. Meus caros, nas leis da física, quantas vezes é possível abrir-um-buraco-tapar-o-buraco-e-abrir-o-buraco-novamente? É demais, pá: ou a câmara de Lisboa é o maior antro de incompetência do país, ou alguém anda a ganhar dinheiro ao buraco.
Coberto por uma camada de pó marroquino, cheguei à Praça da Flores, para o almocinho. Não foi mau. Deu para fazer companhia ao meu Alvarinho, deu para ter rangelistas giras a quatro palmos de distância, e deu para assistir a uma espécie de sub-debate parlamentar entre Miguel Relvas e Alberto Martins (fiquei com a impressão de que Miguel Relvas é que é o presidente da junta, perdão, o verdadeiro líder da bancada parlamentar do PSD).
Terminado o repasto, dirigi-me para a entrada das galerias da Assembleia. E aí os problemas voltaram. Esperar numa longa fila não estava nos meus planos. Ainda por cima, deparei-me com perigos inesperados: estive a uns cinco metros de Ribau Esteves, e Ricardo Rodrigues passou a três metros da fila (por instinto, escondi o bloco e a caneta na roupa interior). Esperei, e esperei, e até comecei a pensar que não ia conseguir entrar. Mas, de repente, vindo dos céus socialistas, apareceu ali um amigo deputado. Ora, consegui entrar como visitante-anexado-ao-senhor-deputado-meu-amigo. Grande erro. Uma vez lá dentro, o senhor deputado foi salvar a nação do ultra-mega-liberalismo, e eu dirigi-me para as galerias. Sucede que não consegui chegar a lado nenhum. Aquilo estava à pinha. Havia ali excursões de pessoas do interior mais profundo, que, não sei porquê, resolveram invadir o parlamento. Meus amigos, ontem, a Maria da Fonte desceu sobre Lisboa. Eu até comecei a sonhar com a hipótese de aquele bom povo vandalizar as galerias numa fúria contra o novo Costa Cabral. Enquanto sonhava com este tumulto redentor, um polícia explicou-me que não podia entrar, porque não estava “acompanhado pelo meu deputado”. Tentei explicar que o “meu deputado” foi à sua vida, e que eu estava “ali como cidadão normal; só entrei com o senhor deputado por acaso, porque ele me viu na fila”. “Ah, mas não pode”, foi a resposta. Escorraçado e sem glória (a Maria da Fonte já não é o que era), fui novamente para a fila. Novo desespero. Não paravam de chegar gigantescos grupos de pessoas, e, por isso, a fila do cidadão normal não andava. Nesta terra, as corporações tramam o indivíduo mesmo à porta do parlamento.
Desisti. Comecei a subir a Rua de São Bento. No caminho, enfiei uma lasca na perna (aqueles passadiços de madeira das obras parecem saídos do Indiana Jones), mandei à fava a madame que estava a permitir que o seu cãozinho sujasse o único espaço limpo da calçada, dei esmolas a três mendigos, e vi dezenas de desempregados e centenas de “novos pobres”, ali na glória do Largo do Rato. Cheguei a casa lesionado, cansado e com três camadas de pó. Na televisão, o Rei Sol estava a dizer que Portugal é a pérola da Europa.
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