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Clube das Repúblicas Mortas

Clube das Repúblicas Mortas

18
Fev10

Sinónimo de distracção

Rui Ramos

O despacho judicial com as escutas a aparentes colaboradores de José Sócrates teve uma enorme utilidade antropológica: apurámos finalmente quantos descendentes o Dr. Pangloss deixou no país onde foi enforcado. São uma multidão. O chefe do governo terá tido gente a manobrar para conquistar jornais, rádios e televisões? Que importa, se afinal não conseguiu? E depois, essas coisas não aconteceram já no passado? No tempo dos lápis azuis, era pior. Vivemos no melhor dos mundos. E se os jornais não espreitassem pelos buracos da fechadura, ainda seria melhor. 

 

É esta a superioridade dos portugueses sobre os americanos. Nestas coisas, os nossos vizinhos do outro lado do Atlântico perdem logo a calma. Em 1974, forçaram um presidente a demitir-se por causa de uns microfones. Pobre Nixon. Devia ter nascido em Portugal. Ter-se-ia poupado ao calvário do Watergate. Os americanos são de facto uns exagerados. Imagine-se que até se convenceram de que estava em causa a liberdade. Falta-lhes perspectiva. Não sabem o que são ditaduras. Se tivessem aguentado, no mesmo século, o Dr. Afonso Costa e o Dr. Salazar, seriam menos dramáticos. Mas quem sabe? Talvez seja por isso que nunca precisaram de suportar Costas ou Salazares. 

 

No fundo do panglossianismo lusitano só há uma coisa: impotência. Vamos admitir que Sócrates tem alguma coisa de Nixon -- um político de várias qualidades, mas ao mesmo tempo um homem azedo, com um complexo de intruso, preso num mundo de cabalas e campanhas negras. Se Sócrates é Nixon, é um Nixon sem os freios e contrapesos que funcionaram no caso Watergate, e tendo à disposição um Estado enorme, perante uma sociedade dependente e fragilizada. Como resistiria ele à tentação de sujeitar o país ao império, minucioso e ciumento, típico de um presidente de câmara da província, a quem qualquer pequeno jornal ou blogue chega para incomodar? E nós? Que fazer para preservarmos a dignidade, senão fazer de conta que não se passa nada? 

 

É verdade que apareceram algumas indignações. Sobretudo de gente nova. É compreensível. A actual democracia assentou na suposta primazia da liberdade. Se as finanças e a economia fossem prioritárias, deveríamos ter ficado no Estado Novo. Mas o “povo”, segundo nos contaram, não estava disposto a trocar por nada a preciosa liberdade. No meu tempo de escola, liam-nos a propósito versos de Sena (“Não hei-de morrer sem saber”...). Assim foram educadas várias gerações. Para quê? Para se lhes rirem na cara quando, um dia, se lembraram de falar da tal “liberdade”. Coitados: julgaram que era a sério. Parecem americanos.

 

Não haverá verdadeiro inquérito – não estamos na América – nem certamente revolução – também não estamos na Ucrânia. Mas haverá, quando passar o “chefe” invocado nestas escutas, outros “chefes” desse género, inspirados pela velha impunidade e com os mesmos meios à mão. Resta-nos, portanto, aceitar tudo com naturalidade, sem reparar. Um dia, nos dicionários portugueses, liberdade há-de ser sinónimo de distracção: seremos livres na medida em que não repararmos no que vai acontecendo ou na medida em que continuarmos a acreditar que, porque antes era pior, nada agora pode ser digno de nota. A distracção já era, aliás, a qualidade maior de Pangloss. E terá de ser a de todos enquanto não pudermos romper com isto.

 

Publicado no Expresso, 13 de Fevereiro.

 
18
Fev10

ASS no Portugal Tropical

Henrique Raposo

Meu caro ASS, numa democracia europeia, uma ministro da Defesa não faz política, não entra em lutas partidárias, e acima de tudo não se intromete numa crise institucional como esta. Vem nos livros, dr. ASS. O ministro da Defesa deve estar caladinho.

 

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