Os "5 de Outubro"
Na Caipirinha, recuperei uma crónica antiga da Atlântico; uma crónica indicada para o dia de hoje:
Os “5 de Outubro”
Ontem perguntaram-me o seguinte: “mas então és monárquico?”. A pergunta estava relacionada com um texto que escrevi na semana passada. Nesse texto, apenas mencionei que há 5 de Outubro mais importantes do que outros. Parece-me evidente que a data da fundação de um actor político é mais importante do que a data de uma simples mudança de regime desse mesmo actor. Ou seja, a fundação de Portugal (5 de Outubro de 1143) é mais significativa do que a revolução republicana (5 de Outubro de 1910). O país tem profundidade histórica; os regimes apenas habitam a superfície ideológica. Mas, atenção, a defesa deste raciocínio não faz de mim um apoiante da causa monárquica. Não, não sou monárquico. Ou melhor, a questão da “Monarquia versus República” é-me indiferente.
Vamos lá imaginar a História de Portugal sem o golpe de 5 de Outubro de 1910: se Portugal tivesse evoluído enquanto monarquia constitucional (como a Inglaterra e os países nórdicos), então, eu apoiaria esse regime constitucional. Não me iria opor a uma monarquia constitucional portuguesa em 2009. Mas como o 5 de Outubro aconteceu mesmo, parece-me contraproducente defender a Monarquia. Se eu fosse inglês, defenderia a monarquia constitucional. Mas eu sou português, logo, não tenho uma monarquia constitucional para defender. E apoiar o regresso da Monarquia parece-me uma investida reaccionária. Galante, mas reaccionária.
A obsessão portuguesa por este debate (Monarquia ou República?) revela, mais uma vez, o pessoalismo primitivo da nossa cultura política. As elites portuguesas só conseguem discutir pessoas concretas e nunca regras institucionais. Por isso, perdem horas a falar das diferenças entre o “rei” e o “presidente”, como se essas diferenças fossem essenciais para a qualidade institucional da nossa democracia. A questão “Monarquia ou República?” é uma falsa questão, meus caros. Aquilo que é realmente importante do ponto de vista institucional – o constitucionalismo liberal – pode existir (e existe) nos dois sistemas. Por outras palavras, as regras da democracia são compatíveis com a Monarquia e com a República. Os EUA são uma República constitucional. A Noruega é uma Monarquia constitucional.
Em Lisboa, estes debates intermináveis em redor do 5 de Outubro escondem um facto facilmente comprovável: Portugal é uma República constitucional, mas tem uma qualidade institucional inferior a qualquer Monarquia constitucional europeia. Não interessa se temos um rei ou um presidente. O que interessa é a qualidade das nossas regras institucionais, que estão a montante de qualquer rei ou presidente.